“Somos um povo honrado governado por ladrões”. Em 1954, o jornalista Carlos Lacerda estampou na capa do jornal Tribuna da Imprensa a manchete que refletia a crise de legitimidade que abateu o governo Getúlio Vargas. Apesar de ter sido publicada há meio século atrás e por um autor que não era lá muito imparcial, a frase pode ser utilizada nos dias atuais para expressar o “divórcio” existente entre o que pensa a sociedade civil e o que a classe política pratica.
A auto-aumento de 91%, somado a todos os escândalos de corrupção que consomem o Congresso há dois anos, acentuou a desconfiança da sociedade em relação ao seu parlamento. Por isso, a opinião pública observará com atenção redobrada a confirmação ou não do reajuste por meio de votação em plenário.
Por sua vez, o plenário não teve um bom desempenho na cassação dos envolvidos no escândalo do “mensalão” e congêneres e adotou uma posição de enfrentamento em relação à opinião pública. Por exemplo, na ocasião de seu julgamento, o deputado Roberto Brant (PFL-MG) convocou seus pares a enfrentar as pressões provenientes da sociedade, desejosa de punição para os envolvidos: “Vou fazer referência, agora, à opinião pública, esse monstro que tantas vezes nos amedronta. (...) Temos de aprender a encarar a opinião pública. Ela não é o povo”. Ao final, Brant foi absolvido e, coincidência ou não, após seu discurso de defesa, nenhum outro parlamentar foi cassado pelo plenário da Câmara dos Deputados.
O STF deu uma nova oportunidade para que o Congresso se reconcilie com a sociedade. Dessa vez, sem o véu do voto secreto, o plenário voltará ao centro das atenções de toda a população brasileira. Caso adote um reajuste mais comedido, acenará que ainda existe esperança para o bom senso e entrará 2007 com uma dose extra de respaldo social. Caso contrário, poderá iniciar sua nova legislatura em uma crise de legitimidade maior do que aquela que levou Vargas ao suicídio.
24 dezembro 2006
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