28 janeiro 2010

Dê uma chance à ética!

O texto é de Roberto Nogueira Ferreira e o poema é de Wladimir Maiakoviski (foto).

O poema de Wladimir Maiakoviski, poeta russo que, oprimido pelo stalinismo se matou em 1930, fez grande sucesso durante a ditadura militar que se instalou no país em 1964. Ele retrata bem a omissão, a alienação do homem enquanto indivíduo diante da opressão e da prepotência dos representantes do estado ditador.

Em pleno século 21, com ditaduras militares fora de moda, convém ao cidadão brasileiro enquanto eleitor, ler e reler Maiakoviski, e no lugar do agente opressor que se vê pisando nosso jardim, veja o político corrupto que começa roubando apenas uma rosa, até chegar ao cinismo descarado como nos mostra a TV, sobre o que ocorre no governo de Brasília. Não podemos deixar que eles nos arranquem a voz e nos transformem em omissos e medrosos. É preciso dar uma chance à ética.


"Na primeira noite, eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim.

E não dizemos nada.

Na segunda noite, já não se escondem:

Pisam as flores, matam nosso cão,

E não dizemos nada.

Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa,

Rouba-nos lua e, conhecendo nosso medo, arranca-nos avoz da garganta.

E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada."

27 janeiro 2010

Os postes e as eleições de 2010!

A pergunta de 1 milhão de dólares desse ano se refere à capacidade de transferência de votos de Lula para Dilma. É uma pergunta que exige cuidado. Transferência interpessoal per si não existe, ninguém pode comprovar.

Entretanto, existe, por parte do eleitor, vontade de ver uma administração bem sucedida ter continuidade. Isso já levou à eleição de alguns "postes" por aí: Celso Pitta em SP (62% dos votos no segundo turno, apadrinhado de Maluf); Conde no RJ (62% dos votos no segundo turno, sustentado de César Maia) e Márcio Lacerda em BH (59% dos votos em segundo turno, apoiado por Aécio e Pimentel).

A transferência acontece quando o sucessor apontado é fortemente identificado com a administração que está se encerrando e possui credibilidade suficiente para sustentar a plataforma da continuidade. E isso a Dilma tem...

26 janeiro 2010

Ótima análise do governo Obama!


Barack Obama, ano I (por Antônio Lassance)

Que tipo de presidente é Barack Obama? Em se tratando da presidência dos EUA, esta pergunta é normalmente respondida situando o presidente de plantão em alguma escala na galeria dos que já ocuparam a Casa Branca. Tal é a referência do debate político travado entre seus dois principais partidos e também é a base da grande maioria dos estudos sobre o presidencialismo estadunidense.

Não é difícil de se imaginar qual é a preferência do próprio Obama. Ele gostaria de estar entre os presidentes que pairam nas alturas; por exemplo, entre os quatro esculpidos no Monte Rushmore, em Dakota do Sul: Washington, Jefferson, Theodore Roosevelt e Lincoln. Entre a natural obrigação de qualquer presidente daquele país em ser suficientemente ambicioso e o risco de parecer por demais presunçoso, Obama teve a sorte de escudar-se na coincidência de ter raízes políticas no mesmo Estado de um dos presidentes da elevada galeria de Rushmore: Lincoln. Por isso, pôde tomar um trem na mesma Springfield-Illinois, onde Lincoln embarcou rumo a Washington, em 1861, e jurar na mesma bíblia do ex-presidente. Com o gesto, Obama homenageava Lincoln, mas subliminarmente homenageava a si próprio com a promessa de um novo divisor de águas na História americana.

A oposição também já escolheu sua imagem predileta a respeito do presidente Democrata: é Jimmy Carter. Para os Republicanos, Obama é um presidente cheio de planos megalômanos e resultados pífios; de retórica mudancista, mas incapaz de coesionar seu próprio partido; um presidente hesitante e concorrente ao último lugar no ranking dos agora 43 políticos já eleitos para o cargo.

Entre os dois extremos, a cada dia que passa, contado um ano desde sua posse, Obama parece destinado a ficar perigosamente próximo de Lyndon Johnson (1963-1969). Por paradoxal que seja aproximá-lo de um texano branco, sem brilho comunicativo, escolhido por Kennedy como vice (na campanha de 1960) justamente para acalmar o eleitorado conservador, o fato é que Obama, assim como Johnson, vê sua presidência como o resultado não apenas de seu perfil, mas sobretudo das circunstâncias que limitam suas escolhas e de um sistema político que empareda seus movimentos. A consequência é que, terminada a lua-de-mel do presidente com a opinião pública, sua imagem distancia-se cada vez mais da autoimagem criada desde a campanha eleitoral. Foi assim com Johnson, tem sido assim com Obama.

Diferentemente de Carter, que trouxe seus amigos georgianos (ele havia sido governador do Estado da Geórgia) e tentou imprimir um estilo pessoal à condução de seu governo, Obama é mais parecido com Johnson no critério de, até agora, não ter brigado com “o pessoal de Washington” (a burocracia da Casa Branca e os responsáveis pela interlocução com o Congresso). Sacrificou certamente suas intenções pessoais e o ímpeto de seu estilo para evitar ser sabotado em suas ações. Como Johnson, manteve em postos-chave pessoas colocadas pelo seu antecessor (Gates, da Defesa, e Bernanke, no Federal Reserve – e se pode considerar na mesma linha a promoção do general Petraeus, de comandante das forças de Bush no Iraque para comandante geral das forças armadas de Obama).

Assim como Johnson, Obama foi senador antes de tornar-se presidente. A experiência foi decisiva para ambos. A desenvoltura de Johnson na relação com o Congresso é reconhecida (NEUSTAD, R. Poder presidencial e os presidentes modernos. Brasília/S. Paulo: ENAP/UNESP. 2008). O pragmatismo de Obama o coloca na mesma trilha. Ambos conquistaram vitórias congressuais importantes e esbarraram em forte oposição entre seus correligionários. Johnson era fustigado por Robert Kennedy. Obama enfrenta a revolta de democratas à esquerda e à direita.

Carter abrira várias frentes de combate e foi colecionando derrotas sucessivas. Obama combina uma clara agenda de prioridades, o que não o impede de realizar movimentos simultâneos. Aliás, a presidência dos EUA funciona à base de movimentos simultâneos em que as políticas interna e externa ou se equilibram mutuamente ou entram em crise sistematicamente. Não por acaso, alguns consideram que são duas presidências: uma para a política interna, outra para a política externa (tese já clássica de WILDAVSKY, “The Two Presidencies”. Trans-Action, 1966, 4 (2), pp. 7–14). Em contraste, o que Carter preservou de mais positivo esteve relacionado à sua política externa: o apoio à política de abertura democrática na América Latina, de defesa dos direitos humanos e os acordos de paz em Camp David. Sua política interna era um desastre. Com Johnson, ocorreu o contrário: seu inferno era a política externa. Há sinais claros de que Obama pode ter o mesmo destino. A mesmice de sua política externa, mesmo que com uma retórica mais sofisticada que a de Bush, é reconhecida desde Chomsky (que é radical) a Zbigniew Brzezinski (que é Democrata).

Kissinger definiu Barack Obama (Der Spielgel, 6 de julho de 2009) como um jogador de xadrez que joga várias partidas simultâneas, mas que realiza um movimento de cada vez, e só então retorna para um novo lance. Johnson também sabia agir dessa maneira.

O que mais os aproxima são suas agendas. Ambos são prisioneiros de uma agenda herdada de seus antecessores: a agenda da guerra. A de Johnson, no Vietnã. A de Obama, no Iraque e no Afeganistão. Em contraponto ao desgaste externo, há uma agenda interna de expansão de direitos sociais. No caso de Johnson, ela tomou a forma da Grande Sociedade, que consistiu em programas de combate à pobreza, promoção da saúde e ações afirmativas de integração racial. No caso de Obama, a prioridade é a implementação de uma política de saúde pública com níveis de inclusão jamais alcançados nos Estados Unidos.

Não fosse a guerra, Johnson estaria na galeria dos grandes presidentes. Seria lembrado por sua votação consagradora (em 1964), não só na esteira da popularidade de Kennedy (morto em 1963), mas pelos embates contra o neoliberalismo (ainda em sua infância) do Republicano Barry Goldwater – defensor de teses que seriam implementadas quase 20 anos depois pela presidência de Ronald Reagan. Figuraria como o maior promotor de políticas de bem-estar social desde Franklin Roosevelt (1932-1945). Poderia estar positivamente associado à conquista de direitos civis. Este não parece ser um roteiro muito diferente do desejado por Obama. O problema é que as guerras não são um mero detalhe. Elas tendem a se tornar um buraco negro capaz de sugar a atenção da opinião pública, consumir recursos preciosos do orçamento, abalar o moral da política externa norte-americana, jogar gasolina na fogueira do antiamericanismo e, claro, destroçar presidentes inteligentes e bem intencionados, como Johnson… e Obama.


Antônio Lassance é professor do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF) e pesquisador do IPEA.

25 janeiro 2010

Dica de site!




A internet acabou de ficar mais inteligente! Vale a pena seguir o blog do Paulo Kramer (K entre nós), um dos melhores professores que tive na UnB, analista inteligente e refinado!



Segue o link: http://paulokramer.blogspot.com

Dossiê PNDH 3

O PNDH-3 foi precedido pelo PNDH-1, que enfatizou os direitos civis e políticos, em 1996, e pelo PNDH-2, que incorporou os direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais, em 2002.

O PNDH-3 adota o princípio da transversalidade, ou seja, ele abrange uma gama muito grande de temas. Por isso, ele é subscrito por 31 ministérios diferentes.

Por isso, é necessário realizar uma ressalva importante: o PNDH-3 aborda temas polêmicos, mas ele é muito mais abrangente (6 eixos orientadores, subdivididos em 25 diretrizes, 82 objetivos estratégicos e 521 ações programáticas).

Os seis eixos orientadores são: I) Interação democrática entre Estado e sociedade civil; II) Desenvolvimento e Direitos Humanos; III) Universalização de direitos em contexto de desigualdades; IV) Segurança Pública, Acesso à Justiça e Combate à Violência; V) Educação e Cultura em Direitos Humanos; VI) Direito à Memória e à Verdade.

De acordo com informações fornecidas pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, “a participação social na elaboração do programa se deu por meio de conferências, realizadas em todos os estados do país durante o ano de 2008, envolvendo diretamente mais de 14 mil pessoas, além de consulta pública. A versão preliminar do Programa ficou disponível no site da SEDH durante o ano de 2009, aberto a críticas e sugestões.”

O plano não tem validade automática. O decreto apenas envia projetos de lei (27 em um momento inicial) para apreciação e votação no Congresso Nacional. Ou seja, os eixos, objetivos e metas são apenas diretrizes que devem (ou deveriam) orientar os parlamentares.

Os pontos destacados negativamente pela imprensa foram:

a) Possibilidade de criação de uma Comissão da Verdade que poderia ter poder para investigar crimes cometidos contra a ditadura, assim como revogar leis emitidas entre 1964 e 1985 que imponha alguma limitação/restrição aos direitos humanos.

Politicamente, haveria dois problemas nessa proposta. O primeiro é a possibilidade de ter militares da reserva julgados pela Justiça Comum (pela Carta de 88, eles só podem ser julgados por tribunais militares). Isso poderia abrir precedente para o fim de uma prerrogativa que os militares consideram como uma garantia para que não houvesse revanchismo por parte dos civis quando eles retornassem ao poder.

O segundo é a possibilidade de revogação da própria lei da anistia, que poderia ser interpretada como um aparato contrário à universalização dos direitos humanos;

b)A segunda questão foi a presença de representantes de movimentos sociais que invadem terras e imóveis nos julgamentos de restituição de posse. Segundo o ministro Vannuchi, a idéia de descriminalizar essas organizações. A proposta gerou reação imediata de setores mais conservadores e da CNA (confederação nacional da agricultura).

c) O terceiro ponto é uma proposta de regulação governamental dos meios de comunicação tendo como ponto de referência os direitos humanos. O conteúdo dos veículos seriam ranqueado de acordo com parâmetros a serem estabelecidos pelo Congresso Nacional. Haveria previsão de sanções. A mais rigorosa seria o a cassação dos contratos de concessão.

O quarto ponto é a descriminalização do aborto, que encontra oposição na CNBB e outros movimentos religiosos.

Análise

O governo não calculou bem o impacto do lançamento do PNDH-3 e criou celeumas importantes que dão início a uma pré-crise com setores importantes da sociedade (militares, conservadores, mídia e movimentos religiosos).

Há vários pontos sensíveis que podem contaminar o debate eleitoral e ter conseqüências para o governo e sua candidata, Dilma Rousseff.

O principal problema é que os tema levantados, especialmente a criação da Comissão da Verdade e a presença de movimentos sociais (como o MST) em processos de reintegração de posse podem levar o a candidatura governista muito à esquerda, distanciando-a do eleitor médio/centrista, alvo a ser perseguido nas eleições presidenciais (como Lula fez em 2002).

O governo sabia da existência de pontos polêmicos. Entretanto, para ele, a questão poderia ser resolvida facilmente: o PNDH-3 será “fatiado” em 27 ou mais projetos de lei e enviados ao Congresso. Aqueles que seriam mais polêmicos permaneceriam por lá, sem tramitação.

Essa era a solução ótima porque o governo poderia prestar contas a setores do PT e do eleitorado engajados historicamente nessas causas sem desagradar totalmente organizações sensíveis (forças armadas, CNBB, ruralistas, mídia, etc...), pois os pontos polêmicos seriam “suavizados” pelo Congresso.

No entanto, essa solução não foi compreendida ou não foi aceita por alguns atores cruciais. Os militares entendem que, mesmo parado no Congresso, o projeto continua sendo uma ameaça de revanchismo contra as forças militares. A mesma leitura é feita pela mídia.

Além disso, foram abertos diversos flancos que podem ser explorados pela oposição.

O governo se colocou em um labirinto. Não pode voltar atrás, sob pena de se comprometer com setores de defesa dos direitos humanos que lhes oferecem apoio histórico. Tão pouco pode levar o PNDH-3 adiante tal como ele está escrito. A saída deve ser a negociação de bastidores com os setores envolvidos a fim de demonstrar que a situação de impasse pode ser resolvida no Congresso.

A estratégia funciona bem quando os atores envolvidos são grupos acostumados ao jogo político/parlamentar. Mas esse não é o caso dos militares e da mídia. Portanto, a resolução do tema ainda possui um forte grau de imprevisibilidade.

No campo das políticas públicas, o ponto mais grave seria o comprometimento de todo o PNDH-3. Deve-se lembrar que ele possui aspectos importantes que não podem ser invalidados. Nesse sentido, é importante ter cuidado e capacidade de separar e “joio do trigo”.