As pesquisas nas eleições de 2010
Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
As pesquisas voltaram a ocupar um lugar controverso nas eleições que fizemos este ano, especialmente na presidencial. Como já havia ocorrido no passado, chegamos ao final com um quase consenso de que é preciso mudar o modo como elas funcionam no Brasil.
Talvez por que todas apontassem que Dilma tinha chance de vencer no primeiro turno e isso não aconteceu, passamos o mês de outubro com todo mundo falando no “problema das pesquisas”.
Face ao desempenho de nossas empresas e profissionais de pesquisa eleitoral, de uma coisa, no entanto, podemos estar certos: em matéria de pesquisas, a sociedade brasileira está bem servida. Ao contrário do que supõem alguns, nas comparações internacionais, nos saímos melhor que a média.
Como tudo que é parte da política moderna, as pesquisas só se desenvolveram efetivamente por aqui depois da redemocratização. Até o início dos anos 1980, a única coisa relevante que tínhamos era a atuação pioneira do Ibope, que, na República de 1945, começou seus trabalhos na área.
Nos últimos 25 anos, o desempenho do setor no Brasil foi, consistentemente, superior ao da maioria dos países avançados, com experiência muito mais longa que a nossa. Quanto ao dos países de nível de desenvolvimento parecido ou menor, não é preciso falar. Basta lembrar que as empresas e os técnicos brasileiros são solicitados e participam de projetos na Europa, na America Latina e na África (especialmente de expressão portuguesa). Somos exportadores de know-how e de tecnologia, e só importamos quando nos é conveniente.
Quem atesta essa performance são estudos acadêmicos que usam metodologia aceita internacionalmente. Não são os próprios pesquisadores que dizem que sabem trabalhar, mas quem tem qualificação para isso.
Só por desinformação alguém daí deduziria que os institutos brasileiros se consideram infalíveis. Se há uma coisa que qualquer pesquisador sabe é que não existe infalibilidade. Aliás, as pesquisas são, provavelmente, as únicas informações que circulam no meio político que trazem um aviso explícito de validade. Todas as demais, da opinião dos candidatos à interpretação dos jornalistas, são taxativas e definitivas. Apenas elas são assumidamente incertas.
Se os institutos brasileiros se comparam (bem) aos de outros países, se nenhum dos sérios se imagina ou finge ser perfeito, qual é o “problema das pesquisas”?
É sempre possível melhorar a qualidade técnica de amostras, refinar a elaboração de questionários, modernizar e tornar mais rigorosos os procedimentos de campo. Ninguém encontrará resistências a isso nos institutos.
Mas há coisas que não compete a eles fazer: educar os meios de comunicação para que não subordinem a cobertura do processo eleitoral a elas; ensinar os políticos a usá-las com inteligência; orientar a opinião pública para consumi-las de maneira adequada. Os institutos não podem ser responsáveis por coisas desse tipo.
O verdadeiro “problema das pesquisas” é que ninguém quer fazer o que é necessário para resolvê-lo, salvo, paradoxalmente, os institutos. Quem o cria, na maior parte das vezes, são os candidatos e suas campanhas, que abusam dos resultados quando “estão bem” e se tornam seus críticos mais ferrenhos e desleais quando “estão mal”.
Alguém já viu, mundo afora, um candidato a presidente convocar uma coletiva de imprensa apenas para acusar uma pesquisa? Pois, no Brasil, acontece. Vide a lamentável cena que José Serra protagonizou este ano.
Os xingamentos de políticos, insuflando seus seguidores a desconfiar das pesquisas “ruins”, os ataques de jornalistas a resultados desfavoráveis a quem os contrata, a falta de preparo de nosso Judiciário para lidar com questões técnicas, tudo isso ajuda a fazer com que tenhamos uma visão desproporcional do “problema das pesquisas” no Brasil.
Um dia, quem sabe, chegaremos ao que deveria ser normal na democracia: boas pesquisas, acessíveis a todos, políticos que não tentam manipulá-las, jornalistas competentes, juízes com conhecimento, ninguém lhes exagerando ou negando a importância.
Enquanto esse dia não chega, vamos vivendo.
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