26 janeiro 2011
Estados Unidos no divã!
O mito da competitividade, por Paul Krugman!
Uma nova palavra da moda, igual à velha palavra da moda. Antes de seu discurso do Estado da União, o presidente Barack Obama telegrafou seu tema principal: competitividade. O Conselho Consultivo para Recuperação Econômica foi rebatizado de Conselho Presidencial para Empregos e Competitividade. E em seu discurso de sábado no rádio, o presidente declarou que “nós podemos superar em competição qualquer outro país da Terra”.
Esta pode ser uma política inteligente. Supostamente, Obama alistou um velho clichê em nome de uma boa causa, como forma de vender um aumento muito necessário no investimento público para um público amplamente doutrinado na visão de que gastos do governo são uma coisa ruim.
Mas não vamos nos enganar. Falar sobre “competitividade” como uma meta é fundamentalmente enganador. Na melhor das hipóteses, é um diagnóstico errado de nossos problemas. Na pior, poderia levar a políticas baseadas na ideia falsa de que aquilo que é bom para as corporações é bom para os Estados Unidos.
Sobre esse diagnóstico errado: que sentido há em fazer com que nossos problemas atuais derivem da falta de competitividade?
É verdade que teríamos mais empregos se exportássemos mais e importássemos menos. Mas o mesmo vale para a Europa e o Japão, que também apresentam economias deprimidas. E nem todos podem exportar mais e importar menos, a menos que encontremos outro planeta para o qual vender. Sim, poderíamos exigir que a China encolha seu superávit comercial –mas se enfrentar a China é o que Obama está propondo, ele deveria dizer isso claramente.
Além disso, apesar dos Estados Unidos apresentarem um déficit comercial, este déficit está menor do que antes do início da Grande Recessão. Ajudaria se pudéssemos torná-lo ainda menor. Mas no final, nossa situação está complicada por causa da crise financeira, não porque as empresas americanas perderam sua capacidade de competir com concorrentes estrangeiros.
Mas não seria um tanto útil pensar em nosso país como sendo a América SA, competindo no mercado global? Não.
Considere: uma empresa líder que aumenta os lucros reduzindo sua força de trabalho é considerada bem-sucedida. Bem, isso é mais ou menos o que aconteceu nos Estados Unidos recentemente: o emprego está em baixa, mas os lucros estão atingindo novos recordes. Quem, exatamente, consideraria isto um sucesso econômico?
Ainda assim, você poderia dizer que a conversa sobre competitividade ajuda Obama a acalmar aqueles que o consideram antinegócios. Tudo bem, desde que ele entenda que os interesses das empresas “americanas” e o interesses do país, que quase nunca são os mesmos, estão no momento menos alinhados do que nunca.
Veja o caso da General Electric, cujo presidente-executivo, Jeffrey Immelt, acabou de ser nomeado como chefe do conselho consultivo rebatizado. Eu não tenho nada contra a GE ou contra Immelt. Mas com menos da metade de sua força de trabalho nos Estados Unidos e menos da metade de seus lucros vindo das operações nos Estados Unidos, a sorte da GE tem pouca ligação com a prosperidade americana.
A propósito: alguns elogiaram a nomeação de Immelt com base no fato dele representar uma empresa que de fato produz algo, em vez de ser apenas outra especuladora financeira. Me desculpem por estourar esta bolha, mas atualmente a GE obtém mais lucros com suas operações financeiras do que com a manufatura –de fato, a GE Capital, que recebeu garantia do governo para sua dívida, foi uma grande beneficiária do resgate a Wall Street.
E o que a adoção pelo governo da retórica da competitividade significa para a política econômica?
A interpretação favorável, como eu disse, é que trata-se de apenas uma embalagem para uma estratégia econômica centrada no investimento público, investimento voltado para a criação de empregos agora e promover um crescimento a longo prazo. A interpretação desfavorável é que Obama e seus assessores realmente acreditam que a economia vai mal porque foram duros demais com as empresas, e que aquilo que os Estados Unidos precisam agora é de reduções de impostos para as empresas e uma maior desregulamentação.
Meu palpite é que trata-se de embalagem. E se o presidente propuser um aumento sério nos gastos em infraestrutura e educação, eu ficarei satisfeito.
Mas mesmo se propuser boas políticas, o fato de Obama sentir a necessidade de embalar essas políticas em metáforas ruins seria um triste comentário a respeito do estado de nosso discurso.
A crise financeira de 2008 foi um momento educativo, uma lição objetiva sobre o que pode sair errado se você confiar que uma economia de mercado regulará a si mesma. Também não devemos esquecer que economias altamente reguladas, como a da Alemanha, fizeram um trabalho muito melhor em sustentar o emprego após o estouro da crise. Mas seja qual for o motivo, o momento educativo veio e foi, sem que nada fosse aprendido.
Obama pode estar fazendo tudo certo: seu índice de aprovação está subindo, a economia está exibindo sinais de vida e suas chances de reeleição parecem boas. Mas a ideologia que provocou o desastre econômico em 2008 está de volta ao topo –e parece que permanecerá lá até causar um novo desastre.
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