Governadores em apuros
De Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Popul (retirado do Correio Braziliense).
Nem sempre nos apercebemos de algumas coisas que acontecem na política, mas elas podem ser muito importantes. Algumas, a ponto de fazer com que tenhamos que mudar nossa imagem da vida política no Brasil.
Tome-se a noção de que, nas disputas eleitorais, existe uma espécie de vale-tudo, onde os candidatos fazem qualquer coisa para ganhar, incluindo agir em completo desrespeito à lei, para não dizer aos princípios mais básicos da ética.
De norte a sul do país, toda vez que se reúnem eleitores em pesquisas qualitativas, são unânimes as queixas contra, por exemplo, a compra de votos, tão frequente nas vésperas das eleições e que todo mundo já viu ou ouviu falar.
Essa prática pode adotar inúmeras faces, desde o simples pagamento em dinheiro à distribuição de bens materiais e favores, da promessa de um emprego ao oferecimento de facilidades nas relações com o governo.
Ninguém acha que agir assim é legítimo para um candidato, ainda que muita gente diga compreender que um eleitor, premido pela necessidade, aceite a oferta.
É com grande ceticismo que o cidadão comum encara a possibilidade de que comportamentos desse tipo sejam banidos de nossa cultura política.
É como se todos concordassem (mesmo a repudiando) com a máxima segundo a qual, em uma eleição, só é feio perder. Para os políticos, o resto pode. E ninguém os pune por isso, nem os eleitores, nem qualquer instituição.
São cada vez mais eloquentes, no entanto, os sinais de que essa situação está mudando. Na verdade, de que já mudou. Veja-se, para confirmar, a sorte da atual safra de governadores, eleita em 2006.
Nunca antes, na história deste país, houve outra com tantos problemas para concluir seu mandato. Quase todos originados de denúncias acatadas pela Justiça por abusos cometidos no processo eleitoral.
Já foram três os cassados, com a consequente posse de seus substitutos. Cássio Cunha Lima (PSDB), Jackson Lago (PDT) e Marcelo Miranda (PMDB) não governam mais a Paraíba, o Maranhão e o Tocantins, respectivamente.
Mais dois enfrentam processos adiantados no Judiciário: José de Anchieta Júnior (PSDB), de Roraima, e Ivo Cassol (PP), de Rondônia. Também o governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), está às voltas com situação parecida.
Passaram igualmente por questionamentos que chegaram ao TSE os governadores de Santa Catarina, Luiz Henrique (PMDB), e do Amapá, Waldez Góes (PDT). O fato de terem sido julgados e absolvidos só confirma que as leis funcionaram no caso de ambos.
Somados, são oito governadores, ou seja, quase um terço do total. Sinceramente, não se pode mais falar de impunidade, pelo menos no que se refere às condutas avaliadas, pelo menos no tocante aos governadores. É muito improvável que a nova safra, a ser eleita em 2010, venha a repetir o que a antecessora fez.
Se o Judiciário, ao que parece, está cumprindo adequadamente o que dele se espera, o mesmo não se pode dizer do próprio sistema político. Na mudança do padrão de impunidade, o Legislativo tem sido de uma tolerância extraordinária, seja no plano federal, seja nos estados.
Acaba, portanto, por ser o responsável pela manutenção do sentimento das pessoas comuns, de que os políticos se imaginam e agem como personagens acima da lei. Nisso, contando com a ajuda nada pequena do presidente da República, que costuma brindá-los com seu carinho mais magnânimo.
Tudo isso vem à mente em função do que acontece no Distrito Federal. Frente ao que foi e está sendo revelado a respeito de como funcionaram os últimos governos, o que vai acontecer? Que resposta será dada pelas instituições?
De um lado, existe o caminho da judicialização, o encaminhamento das denúncias ao Judiciário. De outro, o político, com a abertura de um processo no âmbito da Câmara Legislativa.
Resta saber se os deputados distritais serão como seus pares gaúchos. Se fizerem como eles, a estatística dos governadores em apuros terá Arruda ao lado de Yeda Crusius, sobreviventes de processos que conseguiram evitar.
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