07 julho 2009

Os caminhos da Classe "C".

Diário da Classe C - Silvia Servelinni, diretora do IBOPE

A agência NovaS/B e o IBOPE Inteligência conduziram, em 2008, o Projeto +100 com o objetivo de gerar informações relevantes e inéditas ao mercado e à sociedade sobre a classe C, segmento cada vez mais importante no Brasil. Nosso ponto de vista diferenciado foi: o que uma família típica da classe C faria com 100 reais adicionais no seu orçamento mensal?
  
Para respondermos a essa pergunta, a Nova S/B segmentou os consumidores da classe C a partir dos dados do Target Group Index, estudo do IBOPE Mídia realizado a cada seis meses que retrata o comportamento do consumidor brasileiro. Essa segmentação gerou três grupos distintos: Retraídos, Consumistas e Planejadores.

A segunda fase da pesquisa, realizada pelo IBOPE Inteligência, foi recrutar e acompanhar, durante três meses, de setembro a novembro de 2008, o destino de 100 reais a mais no orçamento de 15 famílias em Recife (PE) e outras 15 em São Paulo (SP), sendo cinco representantes de cada segmento de consumidores em cada cidade pesquisada. Além disso, houve um caso controle do segmento Planejador em Porto Alegre (RS) e outro no Rio de Janeiro (RJ).

Esses 100 reais foram entregues, no início de cada mês, a um morador do domicílio (dona de casa ou chefe de família), que ficou totalmente livre para fazer o que quisesse com o dinheiro, inclusive esconde-lo dos familiares. Esse morador tinha que preencher um diário de despesas e era entrevistado mensalmente.

Com os 100 reais como eixo da análise, o estudo de casos permitiu identificar padrões de comportamento e tendências de consumo e de gerenciamento da renda familiar, apontando conclusões mais duráveis e menos suscetíveis a mudanças na conjuntura econômica nacional. O resultado, portanto, vai além de um simples retrato do momento. 

Comprovamos que a classe C não é um bloco monolítico, pois observamos padrões de orçamento e de consumo bem diferentes, especialmente entre Consumistas e Planejadores. Algumas tendências, porém, nos parecem válidas para a classe C brasileira de maneira geral. São elas:

Não poupam, nem investem : consomem. A classe C parece querer atender necessidades e desejos de consumo reprimidos por muito tempo e o fazem o quanto antes, quase sempre sem planejamento. Somente um dos nossos casos pensou no que poderia comprar com 300 reais ao invés de pensar nos 100 reais mensais! Quando poupam, tendem a ser para projetos de curto prazo.

Pulverização X Concentração. O gasto dos 100 reais tende a ser pulverizado, com foco na satisfação da auto-estima: o dinheiro extra é empregado na compra de roupas e acessórios. As mulheres também gastaram com cosméticos, maquiagem, perfume e salões de beleza, enquanto alguns dos homens aproveitaram o dinheiro para hobbies e tratamento dentário.

Endividamento. É evidente um contínuo endividamento, em diferentes graus, mas também a prioridade em pagar suas dívidas (um dos destinos mais comuns dos 100 reais). Além disso, esses consumidores são solidários no crédito e também compartilha suas dívidas, pois assim como emprestam dinheiro para parentes e amigos em dificuldades, eles também se endividam em nome uns dos outros.

Mudança de comportamento possível. Depoimentos mostram que o hábito de preencher o diário de despesas levou a um esboço de compreensão da necessidade de planejamento dos gastos para que a família pudesse satisfazer com mais tranqüilidade seus anseios e desejos de consumo. 


Impacto da crise. Nenhum dos nossos casos tinha sido impactado diretamente pela crise até novembro e não observamos qualquer mudança de comportamento. Assim como os 100 reais adicionais não mudaram qualitativamente seu padrão de consumo, apenas foram um “gatilho” para anteciparem um gasto, acreditamos que ao sentirem o efeito da crise em seu orçamento os consumidores da classe C adiarão os gastos menos essenciais e urgentes, mas dificilmente abrirão mão do padrão de vida e de consumo conquistado.

Apesar desse texto ser uma análise mercadológica, ele pode ser útil para especular sobre o comportamento político da classe C. Isso é o que todos os marketeiros têm feito atualmente, pois sabem que essa turma decidirá as eleições presidenciais de 2010. 

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