(Crônica mensal do jornal Metrópole/SA - click no título para ler o texto diretamente no site)
Fevereiro é um mês de pouco movimento em Brasília. Os políticos saem para aproveitar o recesso de carnaval em seus estados e as festas realizadas na capital não chegam a empolgar. A calmaria oferece aos analistas políticos a oportunidade de fazer outras coisas, como ir ao cinema, por exemplo. Foi o que eu fiz.
Há ótimos filmes em cartaz. E quase todos com temática política. O primeiro que eu assisti foi “O Leitor”. Trata-se de um romance entre um jovem estudante e uma ex-agente da Gestapo (polícia do regime nazista). Me chamou atenção a capacidade que a protagonista tem de deixar todas as barbáries cometidas durante a guerra para trás e seguir com uma vida normal. Ao final, a lição que ficou foi: pessoas comuns são capazes de atos monstruosos. E monstros conseguem ter existências banais.
O segundo filme da minha lista foi “A Dúvida”. A questão que serve de pano de fundo para o enredo é se um padre abusou sexualmente ou não de um de seus coroinhas. Entretanto, o drama do garoto serve para mostrar que todos atuamos sempre em situações de forte incerteza. Acusado, acusadora e vítima agem conectados pelo sentimento de que as pessoas só agem a partir de palpites, sem indícios concretos e sujeitos a todo tipo de fatalismo.
Nenhum ensinamento pode ser mais valioso para um observador político. Em nosso ofício, a primeira coisa que aprendemos é que a política possui um tempo próprio, que não pode ser domado por ninguém. Por exemplo, em um trecho do livro “O Complô que elegeu Tancredo”, dos jornalistas José Negreiros, Ricardo Noblat e outros, o então governador mineiro ensinava a um assessor a valiosa lição: “Você sabe, não se pode atropelar a ordem natural das coisas. Sabe porque eu perdi aquela eleição em 60? Porque, simplesmente, não era minha vez”. Mais para frente, Tancredo experimentaria novamente a força do acaso. Eleito presidente, adoeceu e faleceu sem poder tomar posse.
O último filme deste arremedo de crítica chama-se Milk. De longe, foi o que mais me impressionou. Narra-se a história verídica de Harvey Milk, um ativista gay que construiu uma meteórica carreira política em torno da defesa de direitos civis para as minorias.
Existe uma forte mensagem contra o preconceito sexual. Acuado por uma onda de leis anti-gays, Milk comandou uma reação conclamando os homossexuais a assumirem suas preferências perante a sociedade. Entretanto, outro aspecto merece destaque. É incrível observar o dinamismo político da democracia americana. O filme ressalta do poder do “um”. A tradição associativa do povo americano permite que um cidadão possa reunir apoiadores, criar espaços de debate público e disputar mandatos, levando intensa mensagem de otimismo.
Para quem vive da política, como eu vivo, isso acaba se tornando muito importante. Por alguns instantes, o realismo cinza da política do dia-a-dia é substituído pelo arco íris dos idealistas. Pena que, assim como o carnaval, eles apenas duram muito pouco tempo.
Um comentário:
Хорошая новость, как долго ожидать публикации новенького материала и вообще стоит ждать ?
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