03 março 2009

Entrevista do prof. David Fleischer (aprender nunca é demais)


Partidos salivam por fundos de pensão''

David Fleischer: cientista político; Pesquisador da UnB diz que políticos buscam proveito próprio ao direcionar recursos de trabalhadores de estatais

Daniel Bramatti (Estadão)

Para o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), partidos políticos devem ficar longe da administração dos fundos de pensão de empresas estatais.

O professor, que é norte-americano, mas leciona na UnB desde 1972, afirma que os partidos querem controlar os recursos dos fundos para fazer investimentos "muy amigos", que tragam benefícios a eles próprios, em detrimento dos trabalhadores e pensionistas.

As afirmações foram feitas em referência à tentativa do PMDB de assumir o comando do Real Grandeza, fundo de pensão dos funcionários das estatais Furnas e Eletronuclear. A articulação, capitaneada pelo peemedebista Edison Lobão, ministro das Minas e Energia, foi barrada pelo conselho do Real Grandeza e pelo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A seguir, trechos de entrevista concedida anteontem, por telefone:

Como o senhor vê essa tentativa, não só de PMDB, mas de partidos em geral, de controlar os fundos de pensão? É mais uma evidência da tradição patrimonialista da política brasileira?

Sim, exatamente. Controlando o fundo de pensão, o partido direciona os investimentos da instituição. Pode direcionar recursos para um investimento muy amigo, ou que tenha vínculo com o partido. Nós já vimos isso na investigação do escândalo do mensalão. Isso já deu muitos prejuízos a fundos de pensão e aos trabalhadores ligados a eles. Houve direcionamento de investimentos para áreas muito arriscadas e o fundo, então, perdeu dinheiro. É muito melhor que os fundos de pensão fiquem longe dos partidos, que tenham uma administração profissionalizada. E é importante observar que os sindicalistas e pensionistas de Furnas estavam radicalmente contrários à tentativa de entregar o controle do fundo Real Grandeza aos peemedebistas.

Como o senhor avalia a atuação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesse caso?

O presidente deu um recado ao ministro Lobão para desistir disso. Mas desistir por enquanto. O maior azar do PMDB foi a facada que o senador Jarbas Vasconcelos deu (ao chamar, em uma entrevista, seu próprio partido de corrupto). O PMDB ficou com uma imagem muito ruim, de partido aproveitador, que pega esses cargos com fins não muito claros, para proveito próprio. A fala do Jarbas Vasconcelos ajudou muito os sindicatos e pensionistas do Real Grandeza a afastar o PMDB do pedaço.

Apesar da resistência dos funcionários, os peemedebistas consideram que têm direito de comandar o Real Grandeza pelo fato de ter indicado a direção da estatal Furnas. Esse episódio ilustra a confusão que se faz no Brasil entre o que é público e privado?

Sim. Por exemplo, no governo Fernando Henrique Cardoso o fundo de pensão do Banco do Brasil, o Previ, foi utilizado para manipular a privatização da Telebrás. Isso até causou a demissão de um ministro. Então, não é de hoje que os partidos salivam pelos fundos de pensão. Isso ocorria no governo Fernando Henrique e em governos anteriores também.

Essa reação dos funcionários de Furnas contra o PMDB é um sinal de amadurecimento em relação ao risco que a politização dos fundos representa?

Sem dúvida. Os funcionários estavam muito cientes de como o Real Grandeza perdeu valor e patrimônio em administrações anteriores, mais vinculadas a partidos. Então eles se mobilizaram para defender o seu próprio patrimônio. 

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