24 março 2009

Hora de discutir a reforma política!



Reforma política: o caminho é o fortalecimento dos partidos 
(Publicado no Correio Braziliense do dia 23 de março de 2009 - a foto é do site www.brasiliavirtual.info) 


Pedro Cavalcante
Doutorando em ciência política (UnB) 

A configuração do sistema eleitoral-partidário é determinante para o enfraquecimento das instituições partidárias e o excessivo personalismo na política brasileira. De forma distinta, países de democracia mais madura, como a Espanha, valorizam os partidos como principal mecanismo de representação política. Com efeito, estudos recentes do Banco Interamericano de Desenvolvimento (Bird) demonstram a relação direta entre a prevalência de partidos nacionalmente institucionalizados e programáticos e políticas públicas eficientes e de qualidade. 

Sendo assim, a reforma política em debate no Congresso Nacional deve necessariamente atacar a debilidade dos nossos partidos. As propostas em voga sobre o fim da reeleição, mandato de cinco anos ou terceiro mandato são casuísmos que não alteram de fato o sistema. Por outro lado, a aprovação das propostas de voto na legenda e em lista fechada preordenada, sem coligações e com cláusula mínima de desempenho, no médio prazo culminará na redução do número de partidos e no fortalecimento interno das legendas. Tais mudanças tendem a facilitar a seleção dos representantes, reduzir os custos das campanhas, tornar factível a fiscalização da Justiça Eleitoral, além de criar condições para a qualificação da atuação parlamentar. 

Atualmente, o eleitor tem dificuldade em escolher o seu candidato diante da excessiva quantidade de pretendentes. Logo, os políticos não têm espaço apropriado para exporem suas opiniões e propostas. O excesso de candidaturas também inviabiliza a efetiva apuração e fiscalização da contabilidade da campanha. As campanhas eleitorais no Brasil são extremamente caras e consideradas a principal semente da corrupção. Embora o país tenha uma Justiça Eleitoral atuante, na prática é matematicamente impossível o monitoramento e a auditoria das contas de todos os candidatos em tempo hábil. A unificação das campanhas no partido reduziria os custos e também facilitaria o acompanhamento efetivo dos gastos e dos financiamentos pela Justiça Eleitoral e pela sociedade civil. 

Quanto ao controle dos representantes, o sistema atual dispersa o poder e prejudica a capacidade de fiscalização pelos contribuintes. O voto no partido tende simplificar essa relação e também ampliar a preocupação dos partidos com a seleção de seus integrantes, haja vista que a pressão da opinião pública por políticos com passado probo refletirá no momento da formação da lista de candidatos. 

Por fim, a estrutura vigente distorce a atuação parlamentar. Na prática, os parlamentares são reféns do Poder Executivo que controla as suas emendas orçamentárias e indicações para cargos públicos e também dependem dos financiadores, dado o alto custo das campanhas. O voto na legenda reduziria a preocupação dos parlamentares em cortejar o Executivo e ainda diminuiria a excessiva influência do poder econômico. Com efeito, os legisladores se dedicariam ao exercício das suas atividades precípuas, ou seja, participar de forma efetiva da produção legislativa e da fiscalização do Executivo. 

Os críticos alegam que tradicionalmente no Brasil vota-se em pessoas e que o novo arranjo induziria à concentração do poder nos líderes partidários. O primeiro argumento é verdadeiro, mas não necessariamente positivo. Ao contrário, o voto personalista tem fortes conexões com conhecidos ismos da política brasileira: clientelismo, populismo, fisiologismo, entre outros — além de desviar a capacidade de controle social sobre a atuação do parlamentar dentro das casas legislativas. No Brasil, o eleitor esquece em quem vota, logo dificilmente fiscaliza. Acerca da tese de oligarquização, o fenômeno já ocorre na maioria dos partidos brasileiros. Cabe à legenda se ajustar às demandas dos seus integrantes e/ou eleitores. Em outras palavras, a executiva do partido pode definir a lista de candidatos ou realizar prévias com sua militância e, assim, o eleitor poderá optar entre partidos com decisões mais centralizadas ou mais participativas. 

Nos últimos 20 anos, inúmeras propostas foram debatidas e perderam fôlego diante da indiferença do Poder Executivo e da perspectiva de curto prazo dos legisladores. Não há preocupação em relação ao sistema político como um todo, o olhar se restringe ao próximo pleito. A adoção dessas mudanças não é uma panacéia. Logicamente, diversos problemas persistirão e novos surgirão. Todavia, a reforma deve caminhar para o fortalecimento das instituições partidárias e, dessa forma, contribuir para aperfeiçoamento democrático do país.

Um comentário:

Valdir Pucci disse...

Excelente o artigo publicado no Correio Braziliense. Consiso e claro no que tange a verdadeira face de uma reforma política. Apenas uma observação: a questão do financiamento público das campanhas. Acredito que essa medida também entra no rol das que desviam a atenção sobre uma verdadeira medida. O problema não é financiar via setor público ou privado, mas sim garantir uma fiscalização evetiva. se esta não ocorrer, os caixas dois, três, quatro... vão continuar a exixtir e a prejudicar partidos, eleitores e sociedade.
Att.,
Valdir Pucci